segunda-feira, 27 de outubro de 2014

JOÃO DO VALE - "PISA NA FULÔ"












     Certa noite, durante a temporada do show “Opinião” em São Paulo, depois do espetáculo, João foi tomar das suas no Bar Redondo, que ficava perto do Teatro de Arena. Lá pelas tantas, foi abordado por um coronel nordestino, aparentemente muito rico, que se deslocara de suas terras especialmente para contratá-lo para fazer um show, no sertão de Pernambuco. Feito o convite, o Coronel avisa:
      - Mas lá tu não precisa cantar essas músicas novas, não, que o povo gosta mesmo é de “Pisa na Fulô”!
      João do Vale já ia declinando do convite quando o Coronel, percebendo o movimento de recusa de seu interlocutor, declinou o valor da proposta. Era irrecusável. João não podia declinar do convite.
      Uma semana depois, sob sol escaldante e em meio a um foguetório, João desembarcava, em avião fretado, na cidade do Coronel.
      Antes de iniciar o show, sob os olhares atentos do padre, do sacristão, do prefeito, da cidade, o Coronel anuncia o compositor de “Pisa na Fulô”.
João do Vale é ovacionado e a multidão vai logo entoando os primeiros versos da canção:
      - "Pisa na fulô, pisa na fulo, pisa na fulô, não maltrata o meu amô”.
      João entra na dança e comanda a galera:
      - “Pisa na fulô, pisa na fulo, pisa na fulô, não maltrata o meu amô”.
      O compositor cantava, alegre, dançava, comandava coreografias, e seguia em sua canção:
      - “Pisa na fulô, pisa na fulo, pisa na fulô, não maltrata o meu amô”.
      O tempo foi passando, o público se cansando, mas João parecia não querer se desfazer da lembrança de seus tempos de “Pé de Xote” e prosseguia, em evoluções coreográficas, decantando os bailes da Pedreira de sua infância:
      - “Um dia desse fui dançá lá em Pedreira, na rua da Golada e gostei da brincadeira..."
      Até chegar, novamente, ao refrão, que já começava a soar insuportável aos ouvidos da multidão.
      - "Pisa na fulô, pisa na fulo, pisa na fulô, não maltrata o meu amô”.
      Lá pelas tantas, percebendo que o repertório não sairia daquilo e temendo se indispor com o povaréu, o Coronel, sutileza de praxe, aproximou-se do cantor:
      - Pelo amor de Deus, canta outra música que essa o povo não aguenta mais.
Imediatamente, João fez sinal à orquestra, parou de cantar e, de modo grave, levantou os braços.
      A galera, atônita, calou-se.
      Fez-se o silêncio.
      João do Vale, então, entoou, à capela, “Sina de Caboclo”, uma das músicas mais engajadas do repertório do show "Opinião":
      - “Eu sou um pobre caboclo, /Ganho a vida na enxada. /O que eu colho é dividido / Com quem não planta nada. / Se assim continuar / vou deixar o meu sertão,/ mesmos os olhos cheios d'água e com dor no coração.” (vide letra completa nos comentários, ou veja/ouça no YouTube)
      Em pânico, o Coronel invadiu o palco, pegou o microfone e, aos berros, desesperado, retomou o enfadonho repertório:
      - “Pisa na Fulô, Pisa na Fulô, Pisa na Fulô, não maltrata o meu amô”!!



PISA NA FULÔ
(João do Vale / Ernesto Pires / Silveira Júnior)

 

Pisa na fulô, pisa na fulô
Pisa na fulô, não maltrata o meu amô

Um dia desse fui dançá lá em Pedreira
Na rua da Golada e gostei da brincadeira
Zé Caxangá era o tocadô
Mas só tocava pisa na fulô

Sô Serafim cuchichava a Marvió
Sô capaz de jurá que eu nunca vi forró mió
Inté vovó garrô na mão de vovô
Vão’bora meu veinho, pisa na fulô

Eu vi menina que nem tinha doze ano
Agarrar seu par, também sair dançando
Satisfeita e dizendo:
Meu amô, ai como é gostoso, pisa na fulô

De madrugada Zéca Caxangá
Disse ao dono da casa
Num precisa me pagá
Mas por favô arranje outro tocadô

Que eu também quero pisa na fulô
Vem cá menina, que eu também quero
Que eu também vou pisa na fulô
Pisa na fulô, não maltrata o meu amô.


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